Um varejo mais pragmático deve cruzar por 2023. De um lado, influenciado por uma economia que vai combinar mais empregos e renda baixa turbinada pelo Bolsa Família, que retorna no lugar do Auxílio Brasil, e juros ainda elevados que restringem o acesso e elevam o rigor para tomar crédito. De outro, usuário da tecnologia, mas com pegada diferente: assimilação das inovações para gerar caixa.
Começando pelo segundo ponto, especialistas e desenvolvedores atentam para lições aprendidas na adoção ou tentativa de usar as tecnologias.
“A flopada (fracasso ou frustração) do Metaverso (fusão do mundo virtual e real) mostrou a limitação da adoção da novidade. A próxima tecnologia de 2023 é usar direito o que a gente tem nas mãos para conseguir vender mais de fato”, aposta o criador do CRM (ferramenta de gestão de clientes) Oto e vice-presidente de vendas e marketing da Pmweb, Augusto Rocha.
No final das contas, mais que embarcar em inovações que custam caro e são ainda para poucos, as empresas precisam aprender a “metodologia” de como usar no negócio uma tecnologia mais acessível para gerar resultados, resume Rocha. Para ajudar operações que ainda têm dificuldades nesta jornada, o criador do Oto cita iniciativas que ele está envolvido, como a ferramenta “amigo do vendedor”.
“É informação gratuita para o cara da ponta ajudando a vender de forma mais inteligente”, descreve. Entidades do setor varejista estão conectadas nessa ideia, como o Sindilojas Porto Alegre. “O caminho é fazer com que o mercado se aperfeiçoe, usando uma linguagem fácil, no estilo Tik Tok. A gente acredita que 2023 é o ano de amadurecimento e uso de tecnologias”, conclui o executivo, como base para decolar.
Na ponta do varejo, a atenção do consumidor e o atendimento estarão entre dois mundos distintos, do físico ao digital, e as pessoas vão valorizar ainda mais a experiência, aposta o presidente da CDL Porto Alegre, Irio Piva. “Quanto mais tecnologia, maior a necessidade de conexão humana”, constata Piva.
O presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra, detecta no terceiro ano da pandemia da Covid-19 uma “certa ressaca de tecnologia, que pode até mesmo explicar a ‘flopada’ do Metaverso”, associada à intensificação da digitalização desde o choque da crise sanitária. “O e-commerce saltou de 4% das vendas, em 2018, para 12% em 2022. Neste fim de 2022, temos quase como uma estabilização e ressaca de tanta tecnologia”, traduz Terra.
A leitura dos dois especialistas em varejo também sugere que o terreno do ano que vem vai ser dividido entre ações para fortalecer a base de uso de tecnologia e preparar novas viradas, que o presidente da SBVC espera para o fim de 2023.
“No segundo semestre, vem um novo ciclo de digitalização, já com o advento do 5G e preparando 2024”, projeta Terra. “O que vai habilitar coisas represadas, como o próprio Metaverso, que parou com a carência de velocidade computacional para rodar as aplicações”, associa o dirigente da entidade.
Saber usar a tecnologia que faça sentido e dê resultado é tudo o que o varejo vai demandar para recuperar desempenho, após um 2022 com altas em setores de consumo mais imediato e corriqueiro, da comida ao vestuário, e decepção nos segmentos de bens mais duráveis e dependentes de crédito, de eletromóveis a materiais de construção.
No campo econômico, Terra demarca dois varejos. O primeiro sustentado por faixas de consumo de itens mais gerais e o segundo, dependente do acesso do consumidor a crédito que ainda se mantém com custo elevado. “O varejo que vive do emprego e renda tem bom prognóstico, mas os segmentos ligados a crédito não terão um 2023 muito fácil”, diferencia o presidente da SBVC.
“Não há clareza ainda do cenário politico e econômico. Se for mais instável, fica mais difícil, ou vai ser o contrário, caso não haja turbulência”, pontua Terra, prevendo menos investimentos em expansão principalmente de redes maiores, devido à pressão dos custos e ainda entrega de resultados.