Sem surpresas, tanto a inadimplência quanto a concessão de crédito seguiram a tendência antecipada pelos indicadores da Boa Vista ao longo do ano passado
De acordo com os dados publicados hoje pelo Banco Central, a taxa de inadimplência das famílias com recursos livres encerrou o ano de 2022 em 5,86%, um pouco acima do registro de novembro de 2022, quando fora de 5,82%, mas bem acima da marca observada em dezembro de 2021, de 4,37%. Esse forte aumento na taxa de inadimplência ao longo do ano passado foi antecipado de perto pelo indicador da Boa Vista de Registros de Inadimplentes, que apontou alta de 19,9% no número de registros de inadimplentes no mesmo período. A Boa Vista é parceira de negócios da CDL Porto Alegre.
Na avaliação de Flávio Calife, economista da Boa Vista, esse aumento na taxa já era esperado desde o início do ano passado “A taxa teve um comportamento muito atípico nos dois anos anteriores, de 2020 e 2021, e agora retrata melhor a situação da maior parte das famílias brasileiras, que sentiram o impacto da inflação e dos juros sobre a renda e sobre a capacidade de pagamento”. Calife também destaca o crescimento expressivo de algumas linhas de crédito consideradas “emergenciais”, como o crédito pessoal não consignado, o cartão de crédito rotativo e o cartão de crédito parcelado. “O crescimento destas linhas de crédito já vinha mais forte desde o final de 2021, quando pressionou bastante o comprometimento de renda das famílias, e naturalmente isso fez com que algumas contas ficassem para trás ao longo do último ano”.
Em relação às novas contratações de recursos livres pelas famílias, a concessão encerrou 2022 em alta de 20,9%, um pouco menor do que a taxa de crescimento verificada em 2021, quando fora de 22,88%. No começo do ano passado não era esperado por um crescimento nessa magnitude, mas o crédito se mostrou forte ao longo desse período, embora essa força contraste com a qualidade de alguns dos créditos que foram tomados. O indicador da Boa Vista de Demanda por Crédito do Consumidor também antecipou a tendência da curva de longo prazo da concessão, encerrando 2022 com crescimento forte, de 15,8% quando considerado somente o segmento “Financeiro”, e um pouco abaixo do registro de 2021, de 18,1%.
O aumento do crédito aconteceu num período de forte elevação nas taxas de juros, também. A taxa anual média de juros cobrada das famílias nestas operações até caiu em dezembro: 2,09 pontos percentuais (p.p.) em comparação ao mês de novembro, mas subiu 10,76 p.p. quando comparada à taxa média de dezembro de 2021. A maior parte deste aumento se deveu ao spread bancário, que cresceu 7,82 p.p. no ano passado, em função, sobretudo, do aumento do risco (inadimplência), enquanto o custo de captação, mais alinhado à taxa Selic, cresceu 2,94 p.p.
“Em 2023 as projeções apontam para mais um ano desafiador, de inflação e juros altos. Além disso há muita incerteza ainda em relação à política fiscal, o que torna o mercado como um todo um pouco mais avesso ao risco. A inadimplência tem espaço para crescer um pouco mais e o crédito tende a desacelerar de forma mais nítida nos próximos meses” concluiu Calife.